Quando é que foi a última vez...


...que entrou num restaurante - num rodízio ou num buffet, por exemplo - e comeu, comeu, comeu, comeu tanto quanto quis, comeu até não poder mais!

… e isso lhe trouxe uma sensação genuinamente agradável?

Quando é que foi a última vez que comprar um telemóvel ou par de sapatos novos lhe trouxe satisfação duradoura? Ou gratidão pelo facto de ter dinheiro para gastar onde bem entender?

Quando é que foi a última vez que passar uma, duas, cinco horas na internet o(a) fez sentir-se conectado(a) com o mundo e as pessoas à sua volta de um modo real, concreto, tangível?

Quanto tempo passou, depois de fazer cada uma destas coisas, até voltar a sentir-se insatisfeito? Até voltar a pensar no próximo gadget, noitada, doce no frigorífico, post de instagram, série da Netflix? E depois no outro a seguir?

Quantos dos nossos filhos perderam o interesse nos seus presentes - desejados e implorados durante meses - duas semanas depois do Natal?



Até que ponto estes actos de consumo não se assemelham um pouco ao acto de coçar uma comichão - quase nem consciente, de pouca importância ou reflexão, só para alívio temporário, no qual depois nunca mais se pensa?


*


Quando é que foi a última vez…

… que recebeu um abraço daqueles mesmo bons?

… que teve uma conversa tão interessante que perdeu a noção do tempo? 

… que passeou por uma paisagem natural e conseguiu deixar-se absorver pelo momento, sentindo a brisa na face e não pensando em rigorosamente mais nada?

A maioria de nós não quer ter coisas; quer querer coisas. A isto chama-se dopamina. 

Vale assim tanto a pena fazer o equivalente de atirar dinheiro - que tanto tempo, esforço e stress custou a ganhar - pela janela, ao comprar coisas que pouco ou nada vão acrescentar à sua vida? Só porque sim?

Há outras maneiras de aliviar essa comichão que nos compele a clicar em "Adicionar ao Carrinho". Estas maneiras raramente são exibidas na publicidade mas existem, e garanto que a relação preço-qualidade é incomparável. Quanto é que custa andar descalço na relva? Quanto é que custa acariciar um animal? Quanto é que custa dançar ao som de uma batida festiva? 

E sabe o prazer que estas coisas lhe trazem? Cientificamente falando, infinitamente mais do que um novo par de ténis. Falta-nos o hábito. Falta quebrar o vício da dopamina. É só. 

Tentemos todos fazer um esforço e paremos de correr (atrás de nem sabemos bem o quê) por uns momentos. Respiremos fundo. Respiremos fundo antes da próxima compra de impulso. Se vai comprar, faça-o em plena consciência, não em piloto automático. O seu ser agradece, a sua casa agradece, e o ambiente também.

Lembre-se sempre de que também vota com a carteira.


- C. Niza

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Da nascente até à foz: a água é de todos

ELOGIO DA ÁRVORE – 1

ELOGIO DA ÁRVORE – 6